A Juventude e a Constituição

O Congresso Nacional promulgou a sexagésima quinta emenda à Constituição Federal para inserir os jovens no artigo 227. A emenda foi comemorada por movimentos juvenis e gestores governamentais, pois tramitou durante 6 anos no parlamento e é a primeira prioridade efetivada dentre as 22 definidas pela I Conferência Nacional de Juventude realizada em 2008.
A inserção inédita da juventude na Constituição tem um valor simbólico incontestável. A emenda reconhece os jovens como sujeitos de direitos por sua condição específica de viverem uma etapa singular do ciclo de vida.
Contudo, a norma não acrescenta novos direitos ao catálogo já previsto na Constituição e também não explicitou direitos específicos aos jovens.
Agora, a esperança é que tais direitos sejam definidos por um Estatuto da Juventude, cuja emenda determina a edição por meio de uma lei.
Da interpretação do novo artigo 227 da Constituição depreende-se que a partir de agora os jovens, juntamente com as crianças e adolescentes, terão “prioridade absoluta” de acesso aos direitos que já lhes eram conferidos por serem universais (vida, saúde, alimentação, educação, cultura, dignidade), mas que dependem muito de políticas públicas para serem plenamente efetivados.
A critica a emenda está na ausência de proporcionalidade, princípio inerente aos direitos constitucionais, que na prática dá a um rapaz de 20 anos a mesma prioridade absoluta que deve ter um menino de sete anos.
A conquista de direitos dá-se por meio da disputa na arena pública. A “prioridade absoluta” às crianças e aos adolescentes visa compensar o fato de que estes sujeitos não podem, por sua condição, pressionar diretamente os poderes públicos para exercê-los. Já os jovens, historicamente, se mostraram prodigiosos na sua capacidade de reivindicarem seus direitos seja nas ruas, seja por representação junto às instituições (disputando cargos eletivos ou exercendo o voto).
Assim, não se questiona a prioridade “política” a ser dada às políticas de juventude, mas o fato de estender a prioridade “absoluta” a 48 milhões de jovens enfraquece a “priorização máxima” necessária às crianças e aos adolescentes e ao mesmo tempo excede-se na proteção aos jovens, visto que o meio mais adequado seria propiciar aos jovens condições para emancipação, incluindo a responsabilidade de atuarem por si para exercer seus próprios direitos sem paternalismo do Estado, sob o risco de domesticar uma geração inteira com reflexos futuros sobre a cidadania.
Embora tenha sido aprovada por “consenso” no parlamento, e sob grande aplauso das organizações juvenis, tal medida é um descompasso que não contribui para a construção de uma democracia com fortes laços de solidariedade entre as gerações.
Outro aspecto de destaque é que a emenda inseriu a expressão “os jovens” sem fazer uma distinção clara com o segmento da juventude e o segmento da infância e da adolescência.
A diferenciação jurídica entre os segmentos repercute na organização das políticas de juventude, que devem se desvincular das estruturas de assistência social, tendo abordagem mais emancipatória e menos de proteção e da tutela, como deve ser para a infância. Os jovens (18 a 29 anos) buscam independência e inserção social autônoma. Portanto, as políticas de juventude devem ter caráter emancipatório.
Acredito que a emenda perdeu a oportunidade histórica de consagrar direitos específicos à condição juvenil: o direito à emancipação; ao financiamento público do tempo livre; à experimentação; à convivência social; à redução obrigatória da jornada de trabalho durante os estudos; à participação; ao trabalho decente ou ao financiamento da sua inatividade; dentre outros direitos úteis aos jovens na construção de suas trajetórias para assim colaborarem melhor com o desenvolvimento da nação.

Edson Pistori, é professor de Direito Constitucional do Centro Universitário Euroamericano. Foi coordenador executivo da I Conferência Nacional de Juventude em 2008.

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